33.5 C
Vila Nova de Famalicão
Sexta-feira, 4 Julho 2025

Teresa, a filha rebelde de Cupertino de Miranda que desafiou um universo dominado por homens

Aguerrida e aventureira, Teresa Cupertino de Miranda morre aos 78 anos. Filha do banqueiro famalicense foi a primeira mulher portuguesa a competir no Paris-Dakar.

3 min de leitura
- Publicidade -

Famalicão

Teresa Cupertino de Miranda, a filha irreverente e rebelde do banqueiro famalicense Arthur Cupertino de Miranda (1892-1988), que foi a primeira mulher portuguesa a competir no rali Paris-Dakar, morreu segunda-feira, 30 de junho, com 78 anos de idade.

A herdeira do fundador do extinto Banco Português do Atlântico (atual Millennium BCP) e da Fundação Arthur Cupertino de Miranda faleceu em casa, na região de Lisboa, durante a noite, na sequência de uma doença do foro oncológico, que se foi agravando nos últimos meses.

Teresa Cupertino de Miranda, uma mulher que fez história no automobilismo nacional.

“A nossa querida mãe e avó, Teresa, morreu em paz durante a noite”, revelou uma fonte da família, em nota enviada ao jornal “Observador”. As cerimónias fúnebres aconteceram na quarta-feira, 2 de julho, com uma missa de corpo presente na Igreja de Santo António, no Estoril, tendo-se seguido o funeral.

Teresa Cupertino de Miranda destacou-se pelo seu espírito aventureiro e por uma carreira no automobilismo, que retratou e imortalizou no livro “Viagem Com o Meu Olhar”, publicado em 2003. Nesse livro fotográfico e de memórias deu conta da sua paixão por automóveis desde tenra idade.

PRIMEIRA MULHER NO PARIS-DAKAR

Corajosa e determinada ajudou a abrir as portas do desporto motorizado às mulheres. E em 1992 tornou-se na primeira mulher portuguesa a participar no rali Paris-Dakar, tendo conseguido completar o percurso entre Paris e a Cidade do Cabo, na África do Sul, ao volante de um Nissan Patrol.

Na imprensa e nas redes sociais, amigos, admiradores e figuras do automobilismo recordam a filha de Arthur Cupertino de Miranda como a mulher que fez história no automobilismo português, por ter aberto caminhos num mundo que era dominado por homens. “O que lhe dava mais prazer nas corridas era deixar os homens ‘a comer poeira'”, recorda o Automóvel Clube de Portugal (ACP), numa nota pública sobre o seu falecimento.

Imagem de Teresa Cupertino de Miranda durante o rali Paris-Cidade do Cabo, em 1992.

No seio da família do comendador nascido na freguesia do Louro, concelho de Vila Nova de Famalicão, Teresa Cupertino de Miranda destacou-se pelo seu espírito aventureiro e rebelde, ao ter enveredado por uma área competitiva à época reservada aos homens.

Ao longo da vida, realizou diversas expedições todo-terreno e competições em vários continentes, ao lado de nomes reconhecidos do automobilismo português. Participou em provas na Europa, Ásia, África e na América do Sul, tendo conhecido muitos países.

“FIGURA AGUERRIDA” DE “ESPÍRITO AVENTUREIRO”

O Automóvel Clube de Portugal (ACP), de que Teresa Cupertino de Miranda foi dirigente (entre 1998 e 2004), recorda-a como uma “figura aguerrida”, que se destacou “pelo espírito aventureiro”, e que “ajudou a abrir as portas do desporto motorizado às mulheres”, tendo deixado marca no todo-o-terreno, entre a década de 1990 e o início dos anos 2000, “não só nos ralis, mas também ao nível das expedições”, aos comandos de um Toyota Landcruiser.

Teresa Cupertino de Miranda com José Megre.

Em expedições fez mais de 80 viagens, muitas delas com José Megre, outro nome histórico do automobilismo nacional e das expedições em automóvel, já falecido e habitualmente apelidado nos meios automobilísticos como “o pai do todo-o-terreno”.

“Filha de Artur Cupertino de Miranda, fundador do extinto Banco Português do Atlântico, cuja família era uma das dez mais ricas de Portugal até ao ’25 de Abril’, o percurso de Teresa Cupertino de Miranda poderia ter sido outro, mas a sua irreverência tornou-a numa das figuras mais marcantes da história do automobilismo nacional”, refere o ACP, destacando a “pioneira no desporto motorizado feminino”, que fica “na memória dos fãs do todo-o-terreno”.

INSPIRAÇÃO PARA OUTRAS MULHERES

Foi graças ao seu pioneirismo que Teresa Cupertino de Miranda inspirou o surgimento de outras mulheres como pilotos todo-terreno, designadamente Joana Lemos e Céu Pires de Lima (ambas em 1997), Elisabete Jacinto (1998) e Maria Luís Gameiro (2025).

E também inspirou a piloto Madalena Antas, uma das três filhas, atualmente com 48 anos, que o portal americano “The Sportster”, em 2017, considerou ser a mulher mais sexy do mundo das corridas.

Em 15 de outubro de 2020, Teresa Cupertino de Miranda foi capa da revista “Sábado”, com base numa reportagem assinada pela jornalista Ana Taborda, sobre “as filhas rebeldes das famílias poderosas”, com histórias de mulheres que quebraram as barreiras impostas pela sociedade à condição feminina.

A filha de Arthur Cupertino de Miranda revelou como regressou a Portugal determinada em percorrer o mundo, após quase uma década no Brasil, para onde foi viver depois da revolução de 25 de Abril de 1974. As primeiras expedições foram Guiné-Bissau-Lisboa e Paris-Cidade do Cabo, em 1991. Foram viagens de pura resistência na antecâmara da sua participação no Paris-Dakar de 1992.

Na capa da revista “Sãbado”, em 15 de outubro de 2020.

Os testes de resistência para essa exigente prova internacional duraram uma semana. Nas revelações feitas á revista “Sábado”, em 2020, Teresa Cupertino de Miranda ainda se lembrava de ter sido acordada a meio da noite para ir buscar um carro a Bragança – e de ter de regressar a Lisboa nessa mesma madrugada; de andar enfiada em charcos de lama; e de ser largada no meio de um pinhal, ao pé de Santiago do Cacém, apenas com uma bússola na mão.

“Levaram-nos dentro de um autocarro às escuras, nem sei se não íamos vendados, e deixaram-nos ali no meio das árvores, com indicações para ir ter a um dado sítio”, recordou à jornalista da “Sábado”. Só depois de ter superado estas provas é que foi aceite na Patrol Ténéré, que lhe traria um teste real bem mais difícil.

Em 1991, numa altura de conflitos no Níger, a expedição liderada pelo piloto José Megre foi parada por militares no meio do deserto. Depois de lhes confiscarem os passaportes, impediram-nos de seguir viagem pelo Sahara e ficaram dois dias em cativeiro.

À família enlutada, o NOTÍCIAS DE FAMALICÃO apresenta sentidas condolências.

Comentários

- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -

Atualidade

O conteúdo de Notícias de Famalicão está protegido.