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Vila Nova de Famalicão
Terça-feira, 10 Dezembro 2024

Obras no Parque da Devesa agitam reunião da Câmara de Famalicão

Câmara de Famalicão alega ao Tribunal que a paralisação da obra do Citeve é “grave prejuízo para o interesse público” e solicita a continuidade da construção. Associação Famalicão em Transição identifica "cada vez mais contradições e ilegalidades" e continua a lutar para reverter o processo na justiça.

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Famalicão

Uma acesa troca de palavras deu a tónica à reunião do executivo municipal de Vila Nova de Famalicão realizada esta quinta-feira, dia 19, na plataforma digital Zoom. Na origem, a proposta apresentada pelo vice-presidente da Câmara, Ricardo Mendes, responsável pelos Assuntos Jurídicos, em que o município alega que a paralisação da obra de construção do novo CeNTI, determinada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, é de “grave prejuízo para o interesse público”.

O primeiro momento de notório desconforto para os vereadores da coligação PSD-CDS foi quando os vereadores do Partido Socialista optaram por ausentar-se da votação, num sinal inequívoco de que não queriam ser parte da decisão que ali seria tomada, inclusive, porque quer votassem contra ou se abstivessem, a proposta seria aprovada pelos vereadores da coligação de direita que, juntos, são mais do dobro dos vereadores socialistas.

E foi isso mesmo que aconteceu. A proposta foi aprovada com oito votos da coligação PSD-CDS. Os três vereadores do Partido Socialista não participaram na votação.

CONTRADIÇÕES E ILEGALIDADES

Mas o momento que veio a seguir foi o que marcou a diferença no tom monocórdico das reuniões do executivo municipal. Dois representantes da Associação Famalicão em Transição inscreveram-se para participar na reunião.

O primeiro a falar foi José Carvalho, que lamentou ser relegada para o final da reunião a participação dos munícipes na discussão sobre o assunto, “não permitindo que os munícipes tenham qualquer tipo de influência no processo de decisão”.

Recorde-se que, de acordo com o regimento da Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, os munícipes só podem fazer as suas intervenções no fim das reuniões do executivo, depois de os vereadores analisarem e debaterem a agenda de trabalhos.

Já Armindo Magalhães, arquiteto, outro dos intervenientes, também da Associação Famalicão em Transição, centrou a sua intervenção naquilo que classifica como “uma série de contradições e ilegalidades”.

INVERDADES E OPACIDADES

“O senhor presidente, pelo menos duas vezes, faltou à verdade”, referiu Armindo Magalhães, citando como exemplos a reunião na qual Paulo Cunha disse aos membros da Associação “que ia disponibilizar o processo e não o fez” e “quando na Assembleia Municipal de 29 de janeiro disse que ainda não era certa a saída das hortas, mas a decisão já estava tomada, pois o seu despacho de 8 de janeiro de 2021 é prova disso”.

No que classifica como “sequência de opacidades”, Armindo Magalhães salientou que a Câmara Municipal só acedeu aos pedidos para consultar o processo após intervenção jurídica e, ainda assim, “só foi fornecida parte do processo”.

Armindo Magalhães destacou que a associação que representa “continua à espera do processo completo”, acrescentando que, “daquilo que conseguimos apurar, vimos uma série de contradições e ilegalidades”. E cita informações encontradas nos documentos consultados relativamente a resíduos tóxicos, incêndios, etc.

“Com a segurança não se brinca”, referiu, questionando se a não entrega do processo completo será “por medo” de serem encontradas “mais ilegalidades”.

A SEGUNDA CONSTRUÇÃO

Relativamente às possíveis alternativas, Armindo Magalhães refere que analisou as plantas dos terrenos e identificou áreas onde o Citeve poderia fazer uma construção nos mesmos moldes e até com área muito superior, sem recorrer ao terreno onde antes estavam localizadas as hortas urbanas.

Armindo Magalhães lembrou ainda que existem muitas dúvidas relativamente aos terrenos, nomeadamente em relação às trocas, cedências e medições de áreas e solicitou esclarecimentos.

Outro ponto destacado foi a segunda fase da construção. “É muito estranho que esteja nos desenhos todos e nunca se tenha falado nisso.”

Recorde-se que tal como o NOTÍCIAS DE FAMALICÃO noticiou, o edifício que está a ser erguido é apenas a primeira fase do projeto, que prevê mais construção. “A continuar assim, dentro de 20 anos não teremos mais o Parque da Devesa”, desabafou.

“É isso que querem para o município?”, perguntou ao presidente da Câmara e aos vereadores, lamentando que o assunto não tenha sido discutido com os munícipes.

Lembrando que há muitas opções disponíveis, Armindo Magalhães disse que “o Citeve, se quiser, pode construir no seu terreno sem afetar o parque ou pode também vender o terreno para construção de habitações e ganhar ali muito dinheiro”.

PREOCUPAÇÕES AMBIENTAIS E DE SAÚDE PÚBLICA

José Carvalho comentou a forma como a proposta foi apresentada na reunião, destacando que “o Município assumiu a defesa exclusiva de uma das partes interessadas, ignorando e menosprezando qualquer ideia ou sensibilidade divergente”.

Para José Carvalho, “a decisão de ocupar o espaço das hortas com um equipamento industrial não corresponde à obrigação do Município na ‘promoção e salvaguarda dos interesses próprios das respetivas populações, designadamente nos domínios do desenvolvimento, ordenamento do território e urbanismo’ como se lê na exposição deste executivo”.

Fez questão de relembrar uma das ideias principais da carta aberta que a Famalicão em Transição fez ao presidente da Câmara e da Assembleia Municipal no mês de março, nomeadamente a possibilidade de “outras soluções de expansão” para o Citeve sem comprometer a integridade do Parque da Devesa.

“E foi assim que começamos o nosso caminho, recomendando a promoção de uma discussão pública que permitisse ouvir os famalicenses e encontrar uma alternativa compatível com o interesse das partes e sobretudo com o interesse dos famalicenses. Infelizmente onde procurávamos pontes, encontramos muros e por isso sobrou-nos um único caminho possível: seguir para os tribunais”, destacou o dirigente associativo.

Fotografia NOTÍCIAS DE FAMALICÃO

José Carvalho apresentou um total de 14 questões a Paulo Cunha, relacionadas a dúvidas quanto ao ordenamento do território e à legalidade do licenciamento da obra e esclarecimentos quanto às características da construção autorizada [fazem parte do processo documentos que caracterizam o edifício como industrial e documentos que mencionam resíduos tóxicos, acesso a camiões, etc.], assim como preocupações ambientais e de saúde pública.

“É no Tribunal que vou prestar as minhas declarações”, disse Paulo Cunha, relativamente às questões apresentadas por José Carvalho. O presidente da Câmara referiu que irá responder aos aspetos técnicos apenas diante da justiça relembrando que o seu nome está incluído na lista de testemunhas arroladas pela Associação.

No entanto, Paulo Cunha, sem fazer menção aos aspetos técnicos, comentou, na generalidade, alguns dos pontos elencados por José Carvalho e Armindo Magalhães. De resto, a posição de Paulo Cunha reitera a posição do Município de Famalicão pela continuidade da obra.

RESPOSTA AO TRIBUNAL

Recorde-se que terminou esta quinta-feira, dia 19, o prazo para o Município de Famalicão recorrer da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que suspendeu, por 10 dias, a obra em construção no Parque da Devesa na sequência da providência cautelar intentada pela Associação Famalicão em Transição.

O Município de Famalicão enviou ontem, dia 18, ao Tribunal a sua oposição à paralisação da obra e hoje, na reunião do executivo municipal, apresentou uma proposta em que alega que a paralisação da obra é de “grave prejuízo para o interesse público”. A possibilidade do pagamento de uma eventual indeminização ao Citeve foi um dos argumentados elencados durante a apresentação da proposta.

Entre os pontos apresentados pelo Município de Famalicão ao Tribunal Administrativo de Braga a solicitar a continuidade da obra estão a importância do CITEVE a nível nacional e internacional, o facto de a obra contar com cofinanciamento por fundos comunitários o que implica o cumprimento de prazos, possível geração de empregos, etc.

Além da providência cautelar para parar a obra, a Associação Famalicão em Transição também vai avançar com uma ação popular para reverter o processo da construção do CeNTI no espaço onde antes estavam localizadas as hortas urbanas.

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