Quando se houve a palavra suicídio fica no ar uma névoa estranha, feita de vergonha, de mistério e de medo. Passaram-se décadas e continua o mesmo silêncio à volta de quem sofre. Só que agora tem outro nome: saúde mental. E outra consequência: milhares de vidas perdidas todos os anos, num país que gosta de se ver como acolhedor, mas que não tem ainda o hábito de escutar.
No passado dia 10 de setembro, marcou o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. A data convida-nos à reflexão não só para prestar homenagem às vítimas, mas para confrontar um sistema que ainda falha em proteger os mais frágeis. Em Portugal, morrem por suicídio, em média, três pessoas por dia. Três. Como se a cada 24 horas alguém desaparecesse.
Mas este não é só um problema de números. É um problema de cultura. De educação emocional. De falta de redes. De preconceito. O suicídio continua envolto numa névoa de culpa e julgamento, que afasta quem mais precisa de ajuda. “Fraqueza”, “falta de fé”, “coisas de quem quer chamar a atenção”, ainda se dizem estas frases, e cada uma delas é uma pedra no caminho de quem tenta sobreviver.
Não há campanhas que cheguem se não mudarmos a forma como falamos ou não falamos, sobre o sofrimento psicológico. As iniciativas existem: a nova linha de apoio nacional, os psicólogos nas escolas, os projetos comunitários de escuta. Mas o estigma continua a matar. E esse combate começa em casa, nos cafés, nas escolas etc.
Porque a verdade é que quase toda a gente já esteve perto: um amigo que “desapareceu”, uma tia que “não aguentou”, um colega que se foi sem explicação. E quase todos nós já dissemos a nós próprios: “devia ter percebido”, “talvez se tivesse perguntado”.
Não temos de ser psicólogos para fazer a diferença. Basta estarmos atentos. Basta perguntar, com genuinidade: “Estás bem?”. E ouvir, mesmo que a resposta nos assuste. Saber que há ajuda e mostrá-la. A nova linha nacional (1411), o SOS Voz Amiga, a Saúde 24. Ou, simplesmente, a nossa presença.
Ninguém quer morrer. Quem tenta o suicídio quer, na verdade, acabar com a dor não com a vida. Se a dor for escutada, há caminhos. Se o silêncio for quebrado, há esperança. A saúde mental não é um luxo, é uma urgência. E falar é o primeiro passo.
Neste mês de setembro, mais do que acender velas ou partilhar posts com laços amarelos, sejamos ponte. Façamos do silêncio uma conversa. Porque às vezes, o que salva uma vida é só alguém que teve coragem de perguntar, e tempo para ouvir.
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