As novas hortas urbanas de Vila Nova de Famalicão anunciadas no passado dia 1 de fevereiro pelo presidente da Câmara Municipal, Paulo Cunha, também serão provisórias e vão ocupar um terreno urbanizável, entre o rio Pelhe e a Avenida dos Descobrimentos, junto ao Hospital Trofa Saúde, no lugar de Freião, em Antas.
O acordo entre o presidente da Câmara e os proprietários já está feito, tendo o contrato de arrendamento sido assinado no dia 1 de fevereiro último. O terreno será de uso municipal até 31 de janeiro de 2031.
Mas tudo pode ser alterado antes disso, como aconteceu com as hortas do Parque da Cidade, cujo terreno estava parcialmente cedido ao município pelo CITEVE ao abrigo de um direito de superfície entretanto revogado, dado o interesse do centro de investigação têxtil em construir para ampliar as suas instalações.
Esta quinta-feira, o assunto vai à reunião da Câmara como facto consumado, só para ser ratificado e não para ser analisado ou debatido.
ESTANCAR A POLÉMICA
A verdade é que desde o dia 1 de fevereiro que a Câmara Municipal já está a pagar pelo arrendamento de dois terrenos que juntos somam 17 mil metros quadrados de terreno para as novas hortas no lugar de Freião, em Antas. São 10.200 euros por ano, durante 10 anos, com atualização anual de acordo com a lei. Contas feitas serão mais de 100 mil euros só para os senhorios.
As condições do arrendamento não foram discutidas em reunião da Câmara Municipal. Não se discutiu, por exemplo, a possibilidade de a autarquia comprar um terreno para que as hortas urbanas tenham um espaço definitivo e ambientalmente enquadrado.
Com os hortelãos a semear críticas nas redes sociais, e tentando estancar a polémica, Paulo Cunha alegou “motivos de urgência” para assinar o contrato de arrendamento antes de submeter as condições desse contrato à análise e debate dos vereadores.
“MOTIVOS DE URGÊNCIA”
Segundo uma informação assinada pelo vice-presidente da autarquia, Ricardo Mendes, que tutela os assuntos jurídicos, a lei confere ao presidente esses “motivos de urgência”. “Em circunstâncias excecionais, e no caso de, por motivo de urgência, não ser possível reunir extraordinariamente a Câmara Municipal, o presidente da Câmara Municipal pode praticar quaisquer atos da competência do executivo, ficando os mesmos sujeitos a ratificação na primeira reunião realizada após a sua prática”, explica Ricardo Mendes, invocando a Lei nº 75/2013.
Esta quinta-feira, o assunto vai à reunião pública do executivo municipal, via Zoom, justamente para ser ratificado e não para ser analisado ou debatido. Fica, assim, por discutir ou debater, por exemplo, as vantagens ou desvantagens de a autarquia comprar um terreno para que as hortas municipais tenham um espaço público em definitivo.
Com o arrendamento, as coisas podem mudar de um momento para o outro, como aconteceu com as hortas que agora vão desaparecer do Parque da Cidade. Desde logo pelo facto de a maior das duas parcelas de terreno arrendadas para as hortas ser urbanizável e poder ser vendida antes do fim do contrato.
A NOTÍCIA EM PRIMEIRA MÃO
Foi o jornal NOTÍCIAS DE FAMALICÃO o meio de comunicação que noticiou em primeira mão, em 12 de janeiro último, que as hortas urbanas iriam desaparecer do Parque da Cidade.
A decisão municipal tinha deixado descontentes dezenas de hortelãos, conforme o leitor pode verificar nos links das notícias relacionadas disponíveis no final deste texto.
O presidente da Câmara só depois do facto consumado é que informou os hortelãos para não prosseguirem com plantações ou sementeiras.
Em 29 de janeiro, na reunião da Assembleia Municipal, que decorreu na plataforma Zoom, Paulo Cunha foi forçado a referir ao caso pela primeira vez, mas sem dar certezas quanto à ampliação do CITEVE nos terrenos das hortas, nem quanto à transferência das hortas para outro local.
A verdade é que, na segunda-feira seguinte, 1 de fevereiro, informou os hortelãos sobre a necessidade de abandonarem os seus talhões de agricultura biológica no Parque da Cidade.
Ao mesmo tempo, a Câmara Municipal, pela primeira vez, informava os meios de comunicação sobre a solução encontrada para as hortas urbanas.
TERRENO PODE SER VENDIDO PARA CONSTRUÇÃO
Também nesse dia 1 de fevereiro, Paulo Cunha assinava os contratos de arrendamento com os proprietários e herdeiros de duas parcelas de terreno para instalar as hortas urbanas, com uma área total de 17 mil metros quadrados.
Porém, o terreno maior, com uma área de 10.907 metros quadrados, é um prédio urbano, ou seja, é urbanizável.
De acordo com a lei, considera-se prédio urbano, para além dos imóveis já edificados e incorporados no solo, qualquer terreno para construção, considerando-se como tal o terreno para o qual tenha sido concedido alvará de loteamento, aprovado projeto ou concedida licença de construção, e ainda aquele que assim tenha sido declarado no título aquisitivo, nos termos previstos no n.º 3 do artigo sexto do Código da Contribuição Autárquica.
Aliás, a cláusula nona do contrato do Município com os proprietários – designados no contrato como “primeiros outorgantes” –, é muito clara quanto ao carácter provisório ou incerto das futuras hortas urbanas: “Fica ainda estabelecido que, no caso de aparecer comprador para o prédio acima identificado, os primeiros outorgantes podem cessar o contrato de arrendamento com o aviso prévio de 240 dias.”
A Câmara Municipal terá o direito de preferência na compra, devendo ser notificada a tempo e horas pelos proprietários, caso estes recebam propostas de negócio. Mas isso é apenas uma possibilidade e não uma certeza.
PAULO CUNHA EXPLICA-SE
A Câmara Municipal afiança que as novas hortas nos terrenos arrendados em Freião permitem “a ampliação do corredor verde urbano para sul de Famalicão à margem do leito do Rio Pelhe”.
Na verdade, a área dedicada às hortas urbanas vai subir de 11 mil para 17 mil metros quadrados.
A autarquia diz que o projeto inclui a criação de uma zona pedonal ribeirinha de utilização pública, entre a Avenida Rebelo Mesquita e a Avenida dos Descobrimentos. Uma zona de utilização pública num terreno que, afinal, é arrendado.
Indiferente a isso, Paulo Cunha garante “mais hortas urbanas, igualmente próximas dos cidadãos que as fazem, com um percurso pedonal ecológico novo”.
E, sobre o terreno arrendado, acrescenta: “É um espaço central com múltiplas capacidades, que garante a todos os hortelãos atuais a continuidade da sua atividade, mas que abre a porta a novos utilizadores, pois haverá mais talhões, e a fruição do espaço ribeirinho a todos os cidadãos.”
Entretanto, numa carta dirigida aos hortelãos, Paulo Cunha escreveu que a autarquia não poderia ter ficado insensível “à necessidade de expansão de instituições como o CITEVE e o CeNTI, que muito contribuem para a nossa dinâmica concelhia”.
O autarca pediu a compreensão pela “inevitabilidade” e deixou-lhes a garantia de que “todos quantos têm o seu talhão terão direito assegurado a novo talhão em idênticas condições ao atual” e que “os serviços municipais prestarão toda a ajuda necessária para que se proceda à deslocação de construções e à rápida instalação no novo espaço”.
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