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Vila Nova de Famalicão
Domingo, 5 Maio 2024

Yeats e um sujeito poético em fuga

Quão bela se torna a evasão na poesia

4 min de leitura
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Raphael de Souza
Nasceu em 1997 em Vila Nova de Famalicão. É licenciado em Línguas e Literaturas Europeias pela Universidade do Minho. É também mestre em Língua, Literatura e Cultura Inglesa pela mesma academia, com tese em Literatura Norte-Americana. Apaixonado pela Literatura desde cedo, começou a escrever poesia aos 15 anos, aventurando-se atualmente pela Ficção. É co-fundador do projeto “Sarcasmos Irónicos”, que visa dar palco a novos escritores.

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“Todas as coisas desengraçadas e desfeitas, todas as coisas velhas e gastas,
O grito de uma criança à beira da estrada, o ranger de uma carroça que se arrasta,
O pesado caminhar do lavrador, chapinhando por entre o húmus invernoso,
São uma afronta à tua imagem que uma rosa faz desabrochar
nas profundezas do meu coração.
 
A afronta das coisas disformes é uma afronta demasiado atroz para ser dita;
A minha ânsia é tudo recriar e à distância sentar-me num verde outeiro,
Com a terra e o céu e a água, refeitos, como um relicário de ouro
Para o meu sonhar da tua imagem que uma rosa faz desabrochar
nas profundezas do meu coração.”
The Lover Tells of The Rose in His Heart,
do livro The Wind Among the Reeds (1899)

De entre os três grandes géneros, a Poesia é talvez aquele que está mais relacionado com a contemplação de coisas que estão além do alcance humano. Muitos são os sujeitos poéticos (que poderiam ser comparados na Prosa com os narradores) que, ao contemplarem cenários que os levam para além da realidade, tentam fugir física ou psiquicamente para esse cenário (a célebre “evasão”). Tal fenómeno pode ser também um dos responsáveis por associar o poeta a um ser louco.

Tendo em conta o poema acima citado, a presente reflexão – a décima-quarta no acervo da rubrica “Literatura Circular” – terá como pontos nucleares a contemplação e a evasão, focando-se na análise de um poema. Devo avisar o caro leitor que esta pequena análise do poema em questão será de cariz pessoal (tal como as análises de poemas deviam ser feitas em geral nas escolas), carecendo assim de objetividade académica.

Nascido em 1865, Yeats foi um dos autores mais importantes da Literatura Irlandesa, ajudando no renascimento da mesma e na sua transformação num instrumento de oposição política ao domínio da Coroa Britânica instalado após o Ato de União de 1800. Também ajudou no renascimento do teatro irlandês através da fundação da Abbey Theatre e da escrita de suas próprias peças (marcadas pelo pensamento nacionalista e pelo uso de lendas ancestrais da Irlanda pré-Cristã e da Irlanda pré-Coroa). Também mantinha interesse no Hermetismo, pertencendo a algumas sociedades – o que explica o conteúdo de vários poemas. Em 1923, torna-se primeiro irlandês a receber o Prémio Nobel da Literatura, o mais alto galardão literário.

Yeats não é um autor muito conhecido no público português, estando mais no radar dos estudantes e professores/investigadores universitários da área das Letras. No meu caso, só conheci o mesmo na universidade, numa cadeira de Literatura Inglesa que se focava na literatura produzida por irlandeses. Contudo, há uma bela coletânea publicada em 2017 pela Relógio D’Água com poemas do autor escolhidos e traduzidos por Frederico Pereira (“Poemas Escolhidos”). O poema visado por esta reflexão provém dessa mesma coletânea.

Uma das coisas que me impressiona neste poema vem na primeira das duas estrofes: uma aparente divisão da realidade em dois mundos, sendo que essa a divisão torna-se no fio condutor do discurso do sujeito poético ao longo deste curto poema. Nessa divisão, o eu-lírico estabelece que, num mundo, estão as coisas velhas/gastas/desfeitas/sem graça, a criança a gritar, a carroça a vaguear ruidosamente e um lavrador a passar de forma pesada, provavelmente desajeitada.

Num mundo paralelo, o sujeito já nos mostra a presença de beleza, de paz e tranquilidade, tudo simbolizado por uma rosa. Para o sujeito, ambos os mundos são incompatíveis, sendo que o primeiro mundo parece chocar com o último (“São uma afronta à tua imagem que uma rosa faz desabrochar nas profundezas do meu coração”).

Já na segunda estrofe, o sujeito nos apresenta de “recriar” tudo, gerando um universo uniforme onde só reina a beleza e a paz. O bucolismo empregue no poema poderá nos remeter para típicas paisagens da Irlanda, muito exaltadas pelos autores nacionalistas irlandeses.

O autor nascido em Sandymount é de facto conhecido na poesia pelo seu olhar contemplativo. A beleza é um tópico que lhe interessa bastante, por vezes associado à figura feminina. É o caso de poemas como Adam’s Curse e When You Are Old. No primeiro poema, publicado originalmente em 1904, já podemos ver através da voz feminina a ideia feminista de que a Mulher se esforça para ser bonita: “Aquela bela, serena mulher (…)/ respondeu: Nascer mulher é saber -/ ainda que tal não se ensine na escola – / que temos de nos esforçar muito para sermos belas”.

Contudo, esta linha que divide aquilo que é grotesco e aquilo que é um paraíso não é algo novo e não se aplica só à poesia. Esta vontade de evadir de um universo “feio” para um universo paralelo mais “bonito” e nirvânico acontece no nosso próprio dia a dia quando tentamos criar formas de fuga da uma vida monótona, por exemplos, passeios ou jogar na lotaria ou ir de férias.

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Raphael de Souza
Nasceu em 1997 em Vila Nova de Famalicão. É licenciado em Línguas e Literaturas Europeias pela Universidade do Minho. É também mestre em Língua, Literatura e Cultura Inglesa pela mesma academia, com tese em Literatura Norte-Americana. Apaixonado pela Literatura desde cedo, começou a escrever poesia aos 15 anos, aventurando-se atualmente pela Ficção. É co-fundador do projeto “Sarcasmos Irónicos”, que visa dar palco a novos escritores.
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