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Sábado, 27 Abril 2024

Da diversidade nas organizações e empresas e outras questões a precisarem de resiliência

Em trinta anos de labor, em diversas empresas, tenho visto por aí práticas laborais extraordinariamente humanas e eficientes, mas também tenho dado conta de muito movimento e pouca acção.

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Marta Duque Vaz
Natural de Famalicão e radicada no Porto, licenciada em antropologia e pós-graduada em economia social, é jornalista e autora de “A Senhora Clap”, livro do Plano Nacional de Leitura, que foi adaptado a uma peça de teatro no Brasil.

Famalicão

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Sou naturalmente vocacionada para a diversidade – podia exemplificar, até de forma risível, com episódios da infância; mas não agora. O certo é que a minha formação académica, em antropologia, contribuiu fortemente para sustentar esse meu instinto para um mundo diverso, multicultural, onde não existem supremacias nem etnocentrismos de qualquer espécie.

Olhando e vendo o que se passa à minha volta: se, por um lado, me parece incrível que ainda seja necessário falar dos benefícios da diversidade, criar eventos que a celebrem, que chamem à atenção para a sua mais-valia; por outro, compreendo bem que seja imperativo falar disto todos os dias; falar, falar e agir, agir e voltar a lembrar, principalmente com boas práticas.

Decorre o “mês europeu da diversidade” que, de acordo com a Comissão Europeia, tem por objectivo chamar a atenção para a importância da diversidade e da inclusão nos locais de trabalho e na sociedade em toda a União Europeia (UE). Trata-se de uma iniciativa que engloba, também, a Plataforma Europeia das Cartas da Diversidade, em conjunto com os seus membros e respetivos signatários, visando reunir as cartas da diversidade, pequenos e grandes empregadores, empresas privadas, organizações públicas e associações sem fins lucrativos em torno da promoção da diversidade no local de trabalho e na sociedade.

No site da Associação Portuguesa para a Diversidade e Inclusão – vale a pena passar por lá – podemos ler na íntegra a Carta Portuguesa que, entre outros postulados, defende que “valorizar as características, as competências e o talento de cada pessoa promove a igualdade de tratamento e de oportunidades, combatendo os estereótipos e as discriminações e fomentando uma cultura de inclusão baseada no respeito pelo ser humano”.

Infelizmente há ainda muitas empresas e organizações longe de assimilarem uma cultura de diversidade em prol do desenvolvimento pessoal e profissional dos seus colaboradores, assegurando uma maior eficiência e competitividade, logo melhorando as condições sociais e económicas. O talento de cada trabalhador é, ainda, em alguns casos desconhecido e, não raras vezes, quando conhecido é desvalorizado.

Tratar o talento de cada trabalhador e olhar para ele individualmente, é uma prática que, em muitas empresas e organizações, não existe. Noutras, é entendido como processo muito trabalhoso, que não compensa pela dificuldade que oferece a certas chefias que veem nos seus colaboradores uma massa acéfala; um rebanho.

Ainda existem estes e outros arcaísmos na gestão de empresas e organizações. É verdade! Não podemos fazer de conta. O tratamento individual, o tratar caso a caso, é entendido como um luxo supérfluo em vez de uma boa prática com retorno excepcional. “Assumir a diversidade como um imperativo ético, traduzindo-se num princípio basilar e orientador da atuação interna e externa, fazendo parte dos seus valores e da sua identidade institucional”, é uma miragem ou, então, mero exercício retórico. As organizações onde tal acontece, de facto, podem e devem dar o seu testemunho, com exemplos concretos, evidenciando que é possível. Talvez assim, com depoimentos reais, se possa motivar outros a sair de teorias inflamadas de vazio.

Uma Carta para a Diversidade é um instrumento valioso, útil, lúcido e cheio de alento. Consiste num documento curto assinado de forma voluntária por empregadores de vários setores (público, privado com e sem fins lucrativos). Descreve medidas concretas que podem ser tomadas para promover a diversidade e a igualdade de oportunidades no trabalho independentemente da origem cultural, étnica e social, orientação sexual, género, idade, caraterísticas físicas, estilo pessoal e religião.

Desde 2004, foram criadas na Europa 26 cartas da diversidade, que prestam apoio e promovem melhores práticas de gestão da diversidade junto de milhares de grandes empresas multinacionais, PME, organismos públicos e organizações sem fins lucrativos. A Plataforma Europeia das Cartas da Diversidade abrange atualmente 26 Cartas Nacionais da Diversidade, representando mais de 12 000 organizações signatárias e mais de 16 milhões de trabalhadores.

Há um guia, traduzido para diversos idiomas – e até em língua gestual portuguesa – para inspirar a celebração do mês que, evidentemente, se deve estender ao ano inteiro; ao futuro. Mas, lá está, mais importante e mais eficaz do que iniciativas pontuais, balizadas por um calendário, mais ou menos criativas; e discursos mais ou menos bem esgalhados, importam acções; acções constantes e quotidianas que se traduzam em efectivo bem-estar de cada cidadão e cidadã no seu local de trabalho, na sociedade.

Em trinta anos de labor, em diversas empresas, tenho visto por aí práticas laborais extraordinariamente humanas e eficientes, mas também tenho dado conta de muito movimento e pouca acção. Por entre iniciativas que germinam – também as há e de muitíssima qualidade – verifica-se, ainda, muito corre-corre para lado nenhum; um mais do mesmo mecânico e sem alma. Números e indicadores, alguns ofensivos, da ética e da dignidade do trabalho sério e empenhado, encaixam em relatórios e modelos “chapa 5”, bolorentos e desadequados feitos para comissões, administrações e direcções que nunca os irão ler, porque se os lessem, interrogariam, poriam em causa, exigiriam que se fizesse diferente e bem melhor.

O tal tratamento individual, não só denota respeito como traz consigo imensas mais-valias recíprocas. E tratar individualmente não quer dizer tratar de modo especial relativamente a outros colaboradores. Bem entendido. Um tratamento individual é, por exemplo, perceber que a cozinheira da empresa/organização não tem de assistir a uma formação sobre a aplicação e gestão de fundos europeus na agricultura, mas, já que lhe é dada possibilidade de formação, que se procure uma adequada às suas funções, contribuindo para o seu real melhoramento, enquanto cozinheira. A isto, também se pode chamar dignidade no trabalho. Ou respeito pelo trabalho diferenciado. O tratamento individualizado, é saber mais sobre aquela pessoa, sobre o seu potencial, sobre o seu talento. Saber de onde veio e para onde quer ir. Este tratamento cria verdadeiras equipas – e não afinidades pelo número de anos na mesma cadeira – estimula produtividade, enfim, defende a diversidade e a igualdade; cria um ambiente de trabalho verdadeiramente inclusivo baseado na justiça, na transparência, no diálogo e na confiança.

Mas a par de tudo isto, dos indubitáveis benefícios de uma cultura organizacional que cultive a diversidade, temos de olhar para as chefias, pois sem boas chefias tudo fica mais difícil. Recordo a investigação do Observatório das Desigualdades que nos revelou que “as qualificações dos portugueses são tão baixas em comparação com o resto da Europa, sobretudo ao nível dos patrões, que o país quase parece “pertencer a um mundo diferente”.

O autor do estudo “O Mercado de Trabalho em Portugal e nos Países Europeus: Estatísticas de 2018”, disse numa entrevista ao Expresso que a precariedade tem vindo a crescer e é um fenómeno estrutural do mercado de trabalho. “Mais de um terço dos dirigentes, diretores e gestores em Portugal concluíram apenas a escolaridade básica. Têm um nível médio de habilitações mais baixo do que os seus empregados. Dentro deste grupo temos os donos das empresas e as pessoas que, mesmo não sendo donas, estão ao leme das empresas em funções de direção ou gestão executiva. Quando são as chefias a ter esse tipo de perfil ainda é um travão maior e agudiza mais a capacidade de adaptação das empresas às novas tecnologias, a sua capacidade de inovação ou até a gestão de recursos humanos”, explicou o investigado. O problema, como sabemos, é estrutural. E esses demoram a solucionar.

Portanto, resta-nos ser resilientes e continuar, com brio, comprometidos com as boas práticas da diversidade. E não desistir, nem deixar de acreditar, muito menos deixar de semear. Ainda que seja um semear solitário, coisa de minorias, importa a firmeza. Mesmo que não sejamos nós a colher. Outros, seguramente, virão. Apesar de lenta, muito lenta, a mudança, está a acontecer.

(A autora escreve na antiga ortografia)

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Marta Duque Vaz
Natural de Famalicão e radicada no Porto, licenciada em antropologia e pós-graduada em economia social, é jornalista e autora de “A Senhora Clap”, livro do Plano Nacional de Leitura, que foi adaptado a uma peça de teatro no Brasil.
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