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Domingo, 5 Maio 2024
Dina Coelho
Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).

“A falta de audição não impede nada. Com esforço, tudo se faz”

Hoje quis dar-vos a conhecer um exemplo de dedicação, superação e uma inspiração para todos. Entrevista com Mariana Couto, a primeira médica surda em Portugal.

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Dina Coelho
Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).

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Uma breve apresentação…

Nasci em Setúbal, numa terça-feira chuvosa no dia 4 de janeiro de 1994. Cresci na Linha de Cascais, entre Parede e Oeiras. Aos 15 anos, passei a viver no centro de Lisboa, de onde sai recentemente, para residir numa aldeia no concelho de Torres Vedras.

Sou surda desde a nascença. Crê-se que foi efeito de um medicamento ototóxico que a minha mãe tomou durante a gravidez. Tenho surdez neurosensorial bilateral profunda (cofose).

O meu pai foi um dos fundadores da Associação das Famílias e Amigos dos Surdos, pelo que cresci envolvida pelo movimento associativo. Ele tornou-me sócia da Associação Portuguesa de Surdos aos 2 anos de idade, onde até hoje ainda sou associada.

Fui vice-presidente da Comissão Nacional de Juventude Surda e, neste momento, sou vogal da Direção da Federação Portuguesa das Associações de Surdos.

Nos tempos livres, gosto muito de ler, de cozinhar e de fotografar.

Como foi o seu percurso educativo?

Aos 18 meses de idade, os meus pais desconfiavam de que eu poderia ser surda. O diagnóstico foi confirmado aos 21 meses. Logo de seguida, os meus pais e alguns outros familiares procuraram aprender Língua Gestual na Associação Portuguesa de Surdos, para depois comunicarem comigo. Foi assim que aprendi a comunicar com o mundo, em casa, quando os meus pais voltavam das aulas de LGP. Posteriormente, fui para a hoje extinta Escola da Junqueira (em Belém), tendo sido esta a primeira escola onde estive com outras crianças surdas. Mais tarde, frequentei o Jardim da Infância no antigo Colégio de S. Marçal (Casa Pia de Lisboa) e o ensino primário e o quinto ano foram feitos no Instituto Jacob Rodrigues Pereira (IJRP – Casa Pia de Lisboa). Do sexto ao nono ano, frequentei a Escola Básica Integrada Quinta de Marrocos, em turmas de ouvintes, apesar de terem existido turmas de surdos. No ensino secundário, optei por estudar em colégios privados, de ensino regular, na área de Ciências e Tecnologias, nomeadamente no Colégio da Lapa (10.º ano) e no Colégio Salesiano de Lisboa (Oficinas de S. José – 11.º e 12.º anos).

Ingressei no Ensino Superior aos 18 anos, no curso de Engenharia Biomédica no Instituto Superior Técnico. No ano seguinte, ingressei na Nova Medical School (Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa), onde conclui recentemente o Mestrado Integrado de Medicina.

Sempre quis ser médica?

Em pequena, sempre quis ser médica veterinária, dada a minha grande afinidade com animais. Só em adolescente passei a ponderar na vertente humana, a medicina de “pessoas”, e a partir daí o restante percurso educativo foi delineado no sentido de alcançar essa meta.

Sentiu obstáculos como estudante de medicina por ser surda? Se sim, quais e como foram ultrapassados?

Os maiores obstáculos foram transversais a qualquer estudante de Medicina, dado o elevado grau de exigência deste curso, e não necessariamente devido ao facto de ser surda. Para mim, os maiores desafios foram as provas orais, que foram facilmente ultrapassados com o recurso ao papel e à caneta nos momentos de incompreensão.

Qual acha que foi ou é a perceção dos seus colegas de curso, professores e atualmente colegas de profissão face a uma colega/médica surda? E dos utentes?

Sempre fui bem aceite no ambiente académico. Tive um excelente ano como caloira, onde senti muito apoio e aceitação de várias partes, desde colegas a professores. Evidentemente, existiram dificuldades com um e outro professores, mas foram naturalmente resolvidas com o tempo. Durante os estágios clínicos, tive facilidade em me integrar nos serviços, nomeadamente nos de Cirurgia Geral e de Medicina Interna, onde fiz parte da equipa e me trataram de igual para igual. Enquanto profissional, ainda não tive essa experiência, dado que começo a trabalhar apenas em Janeiro, conforme o Internato de Formação Geral que todos os médicos recém-licenciados têm de fazer, com duração de doze meses, antes de exercerem com autonomia.

Como consigo fazer-me compreender através da língua oral e tenho facilidade com a leitura labial, a comunicação tem sido, em maior parte, através deste método. Quando existe dificuldade, recorre-se ao papel e à caneta. Realizei os estágios clínicos do último ano em tempo de pandemia, onde o desafio da comunicação foi muito maior devido à utilização generalizada da máscara, pelo que utilizei muitas vezes a aplicação Google Transcribe, que faz transcrição da voz para texto, apesar de ainda não de forma perfeita.

O que considera que foi crucial para o seu sucesso?

Definitivamente a aquisição precoce da língua e, com isso, a possibilidade de conhecer o mundo desde cedo. Tive também a alegria de ter começado a aprender a ler e a escrever a partir dos dois anos, quando costumava sentar-me ao colo do meu pai, dia após dia, enquanto ele me mostrava várias palavras em letras grandes no computador. Estes estímulos permitiram que tivesse crescido como criança bilíngue, dominando facilmente duas línguas – a gestual e o português escrito. O suporte familiar também foi essencial.

Que expetativas tem para o futuro?

Que a saúde possa ser universalmente acessível e tal incluí as pessoas surdas, que são o meu maior foco. Pretendo, sobretudo, investir tempo em projetos que proporcionem melhores condições no seu acesso à saúde.

Acha que a partir de agora pode dar-se a alteração de paradigma da acessibilidade da pessoa surda no Sistema Nacional de Saúde?

Eu, sozinha, não conseguirei mudar um todo sistema. O esforço tem de vir de várias frentes, incluindo da própria comunidade surda.

Parabéns por todo o seu percurso. É, sem dúvida, um exemplo de dedicação, superação e uma inspiração para todos. Gostava de deixar algum conselho a pais e professores de surdos e também aos surdos que tantas vezes veem os seus sonhos adiados?

Aos pais de crianças surdas: deem às crianças o que de mais natural é para elas, a língua gestual, e comuniquem com elas nesta língua. É na família que começa a sua integração na sociedade.

Aos professores de surdos: não facilitem. Através da língua gestual e do português escrito, o desenvolvimento cognitivo da criança surda é perfeitamente possível.

Às pessoas surdas: a falta de audição não impede nada. Com esforço, tudo se faz.

 

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Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).
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