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Quarta-feira, 8 Maio 2024
Dina Coelho
Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).

Em tempos de guerra

A exposição a atos de violência, a incerteza e a falta de controlo relativa ao futuro, o desrespeito pela dignidade humana traduzem-se em possíveis ameaças à nossa saúde psicológica.

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Dina Coelho
Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).

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Foi por volta das 6h30 da manhã do dia 24 de fevereiro, quando através de uma mensagem no whatsapp soube que a guerra na Ucrânia tinha iniciado. Um aperto no peito, medo… Mil e um pensamentos acerca das repercussões que esta guerra poderia ter passaram pela minha cabeça.

Rapidamente nos prontificamos a ajudar este país, os seus refugiados, e a valorizar o que consideramos as “pequenas coisas da vida”. Mas, sinceramente, pouco tempo depois procurei evitar as notícias da guerra, de forma a minimizar qualquer preocupação e pensamentos negativos. Eu tenho possibilidade de o fazer, mas nem todos têm… Sempre que olho para os meus colegas de profissão, intérpretes de língua gestual em contexto televisivo penso “como é que ainda são capazes? Quatro meses a interpretar diariamente estas notícias que mexem com as nossas emoções?”

Por isso decidi trazer este tema e falar com dois colegas, Liliana Duarte, intérprete na TVI/CNN e Márcio Antunes, intérprete na RTP1, que realizam este trabalho frequentemente, para percebermos como se sentem e de que forma tentam gerir as suas emoções.

Liliana Duarte começa por lembrar a guerra que vivenciamos anteriormente que exigia também destes profissionais uma grande capacidade de controlo emocional “Até à madrugada de 24 de fevereiro, o Mundo habituara-se à guerra contra a covid-19. E tinha sido assim nos quase dois anos que antecederam o conflito militar. Traduzir notícias de mortes, ainda que trágico e avassalador, tinha passado a ser parte do quotidiano de quem trabalha em televisão. Entre estratégias mais ou menos conseguidas, a vida seguia e, eu, como tantos outros intérpretes, fomos lidando com as notícias aos tropeções.”

E de facto a vida seguiu e outra guerra surge entre nós… Liliana refere “A vida seguia… De supetão, a notícia de exercícios militares das tropas russas perto da fronteira ucraniana faz soar os alarmes. Recordo-me de estar a traduzir e a pensar que seria impensável ameaçar a soberania de outro país em pleno século XXI. A Guerra dos homens sobrepõe-se então à guerra pandémica, e em cada reportagem traduzida de destruição, de fome, de tortura, de morte, de separações, de lágrimas… e de crianças que certamente crescerão sem pais – trava-se uma nova guerra que cresce por dentro: – tenta-se, outra vez, evitar o choro. E chora-se. Muito e em direto. E aceita-se sem questionar.”

Márcio Antunes relata o quão difícil é “é duro, principalmente porque senti medo, por ver aquela realidade tão próxima. E as imagens… o que é dito… a forma como nos atinge. Nós não estamos à espera, não sabemos propriamente o que vai ser dito”.

Recorda o primeiro dia “foi dos piores dias que tive nos últimos tempos. Cheguei de manhã à televisão e tinha começado a guerra, levei um programa inteiro com aquela notícia. Eu não sabia o que se estava a passar, não sabia o que estava a acontecer, o que tinha acontecido… a única coisa que tinha visto, foram as poucas notícias anteriores, sabia que ia falar disso mas não com a intensidade que foi. Psicologicamente não estava preparado para lidar com aquela informação toda.” Como estratégia, o intérprete Márcio menciona que “o que faço para me preparar é tentar distanciar quem eu sou do que estou a fazer. Muitas das vezes acabo por me esquecer das notícias que interpretei porque tento não absorver a informação que lá está e ser apenas uma ponte de comunicação.”

Considerei importante ter aqui também a perspetiva e conselhos de um profissional de saúde mental, e daí a colaboração da minha psicóloga, Dra. Marta Ribas da Silva (CP 26350), para percebermos que estratégias podemos adotar de forma a gerir as emoções e os sentimentos decorrentes em situações de crise como esta, da melhor maneira possível.

Marta Ribas da Silva destaca que “Em primeiro lugar, importa referir que, inevitável e naturalmente, uma situação de Guerra nos afeta a todos. A exposição a atos de violência, a incerteza e a falta de controlo relativa ao futuro, o desrespeito pela dignidade humana traduzem-se em possíveis ameaças à nossa saúde psicológica. Deste modo e estando ainda no rescaldo da pandemia, é normativo que nos sintamos chocados, ansiosos, assustados, frágeis, desanimados, desesperançados, impotentes, tristes, entre muitas outras possibilidades. Em segundo lugar, é importante salientar que cada um de nós vive e reage de uma maneira diferente à mesma experiência, ou seja, cada um de nós lida com as suas emoções, pensamentos e sentimentos de maneira distinta e, portanto, é natural que algumas pessoas apresentem, mais do que outras, uma maior dificuldade em gerir toda a carga emocional associada a acontecimentos de cariz perturbador como este. Qualquer que seja a nossa forma de reagir e não podendo controlar este tipo de acontecimentos, é fundamental expressarmos, aceitarmos e “darmos voz” áquilo que, efetivamente, estamos a sentir, para que a nossa adaptação seja mais regulada e facilitada.

A psicóloga refere que é igualmente relevante limitarmos a nossa exposição às notícias (1 a 2 vezes por dia e em fontes fidedignas) uma vez que, estarmos constantemente atentos a todos os detalhes e a toda a informação disponível, pode levar a um aumento da nossa sensação de desespero, da ansiedade e do medo. Uma outra estratégia passa por tentarmos descatastrofizar os nossos pensamentos, vivendo o presente sem especular muito acerca do futuro ou do “pior cenário que pode acontecer”, lidando com todas as mudanças e desafios à medida que estes vão surgindo.

Além disso, Marta Ribas da Silva acrescenta que partilhar a forma como nos sentimos com familiares e amigos reforça que não estamos sozinhos e que nos podemos apoiar uns aos outros, promovendo uma maior sensação de bem estar e de pertença. Manter a nossa rotina, investir no autocuidado e nas atividades que nos dão prazer são formas fulcrais de contribuir para a nossa saúde psicológica: ajuda-nos a aumentar o sentimento de segurança e a não ignorar que existem, igualmente, coisas boas a acontecer na nossa vida.

“Não poderia deixar de referir o nosso papel em reforçar a esperança através do apoio e das contribuições que podemos dar, enquanto comunidade, para não só minimizar o impacto da guerra, mas também aumentar a nossa perceção de controlo e de utilidade e os nossos sentimentos de propósito, compaixão e solidariedade. Por último, mas não menos importante, é crucial avaliarmos e monitorizarmos a nossa saúde psicológica e procurar ajuda sempre que sintamos que “algo não está bem” (mesmo que isso implique “não saber o que se passa”) ou caso existam pequenos sinais ou alterações que começam a limitar a forma como vivemos o nosso dia a dia”, destaca Marta Ribas da Silva.

E termino mais uma vez com a Liliana Duarte, que provavelmente descreve que nem uma luva o trabalho que é feito por este profissionais por eles mesmos: “A vida segue… Cria-se uma dimensão fechada numa redoma de vidros baços que coexiste com a realidade lá fora; cruzam-se os dedos à espera de que o efeito de dormência dure apenas o tempo noticioso. Mas a guerra dura para além disso e, como não tem data para findar…carregam-se baterias para o dia a seguir, como quem, com o mesmo afinco, lá longe, carrega as armas para o minuto seguinte, porque o amanhã nem sempre chega.”

Admiração por todos os que lidam com isto diariamente. Obrigada.

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Dina Coelho
Residente na freguesia de Bairro, é filha de pais surdos e intérprete de língua gestual portuguesa (LGP). Exerce a profissão de intérprete de LGP desde 2015, em vários contextos, mas essencialmente no âmbito educativo. É coautora do livro Por Amor e mestre em gerontologia. Atualmente pertence aos órgãos sociais da Associação de Tradutores e Intérpretes de Língua Gestual Portuguesa (ATILGP) e da Associação de Surdos de Apoio a Surdos de Matosinhos (ASASM).
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